Meridianos & Paralelos
Um blog de notícias alinhavadas quase sempre à margem das notícias alinhadas
quinta-feira, julho 29, 2004
«ADEUS, Ó SERRA!...»
Não sei qual a visão mais tenebrosa: se a que se tem no solo,se a que se sobrevoa daqui. É impossível descortinar quantos fogos, quantos reacendimentos, se há casas, se ainda lá ficaram pessoas...! Os rolos de fumo do que arde mistura-se à fumaça do que ardeu e não se vê mais nada a não ser esta fogueira monumental que se estende por hectares e hectares, torna o ar irrespirável e o calor ainda mais sufocante. Há décadas que o interior algarvio luta contra a desertificação das populações que descem da serra ao barrocal, atraídas por uma vida menos dura rente à costa, onde as praias e o turismo oferecem emprego. Olho o Caldeirão ateado neste lume bárbaro e recordo-o como tantas vezes o atravessei: em penedos de muitos verdes a suceder-se ao sinuoso das curvas. Recordo as mil colmeias a pontilhar as encostas e o odor doce dos medronheiros. Aqui os que ficaram viviam da cortiça. Podiam ser poucos, mas tinham aquela que está classificada como a melhor cortiça do mundo. Basta lançar um olhar daqui para perceber que vai demorar gerações e gerações para que o Caldeirão volte a dar cortiça. Sem mel e sem medronho, nenhum outro meio de subsistência resta à gente serrana. Como dizia há pouco um homem, entre a indignação e a miséria: «E agora? Agora,temos todos que abalar daqui!»